10/08/2023
Madeireira de Goiânia que fez depósitos para ajudante de ordem de Bolsonaro e tinha ligação com a Codevasf movimentou 33 milhões nos últimos 3 anos
Que a madeireira 'Cedro do Libano', de Goiânia, já era investigada por ter feito depósitos que somavam pouco mais de 25 mil reais na conta de um dos homens da ajudância de ordem do ex-presidente Jair Bolsonaro, todo mundo já sabia...
Mas que a empresa que tem um capital de cerca de 15 mil reais movimentou 33 milhões nos últimos 3 ano, a apuração da jornalista Fabiana Pulcineli revelou.
De O Popular, de Goiás:
Empresa goiana alvo da CPI de 8 de janeiro movimenta R$ 33 milhões
Dados de madeireira investigada pela PF por repasses a militar ajudante de ordens de Bolsonaro revelam transações incomuns de 80 nomes e com outras contratadas pela União
Com capital social de R$ 15 mil e movimentações atipicas de R$ 33,27 milhões nos últimos três anos, a madeireira goiana Cedro do Líbano é um dos alvos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos no Congresso, diante de suspeitas que podem abrir caminho para apuração de outras empresas. A madeireira é investigada desde o primeiro semestre pela Polícia Federal (PF) por repasses feitos a um militar da ajudância de ordens da Presidência da República sob Jair Bolsonaro (PL), e nega irregularidades.
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) entregou à CPI, relatório da movimentação da empresa que aponta transferências e recebimentos incomuns de 80 nomes, entre pessoas fisicas e jurídicas.
O POPULAR teve acesso ao documento que inclui, na lista de depositantes, duas outras empresas - sendo uma de Goiás - que, assim como a Cedro do Libano, receberam pagamentos feitos pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba Codevasf).
O Relatório de Informações Financeiras (RIF) também revela movimentação atípica de R$ 2,9 milhões do segundo-sargento Luis Marcos dos Reis, o militar que atuava na ajudância de ordens e está preso em outra investigação, de suspeita de falsificação de cartões de vacinação. Ele era subordinado ao tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens e também investigado em uma série de irregularidades.
A Cedro, que fica em Goiânia, foi contratada para fornecimento de quatro plantadeiras e adubadeiras mecanizadas no Amapá, no valor R$ 188 mil, pela Codevasf em 2021. Ela teve contratos também com a Universidade Federal do Espírito Santo e com o Instituto Federal do Tocantins em 2022 - R$ 75 mil e R$ 36,7 mil, respectivamente.
O UOL revelou em maio que a empresa e seu proprietário fizeram uma série de transferências ao sargento dos Reis, que, por sua vez, sacou dinheiro para pagar despesas de um cartão de crédito usado por Michelle Bolsonaro em pelo menos três ocasiões, segundo a PF. Ele teria feito ainda ao menos 12 depósitos na conta de uma tia de Michelle. A PF identificou R$ 25 mil em transferências da Cedro e seu dono ao sargento.
Os dados foram obtidos a partir de uma autorização de quebra de sigilos dos ex-auxiliares de Mauro Cid, ainda no ano passado, pelo Supremo Tribunal Federal. Na ocasião da matéria do UOL, a assessoria de Michelle negou conhecimento sobre os pagamentos e o sargento.
Em 7 de julho, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) apresentou requerimento à CPI de solicitação do RIF da Cedro. O pedido foi atendido 11 dias depois pelo Coaf.
O documento relata que a Cedro foi fundada em novembro de 2008 e atua no ramo de comércio varejista de madeira e artefatos, com faturamento médio mensal de R$ 248,6 mil. A empresa é de propriedade de duas mulheres, mas o marido de uma delas, Vanderlei Cardoso de Barros, é quem administra de fato a empresa, segundo a própria madeireira e o Coaf.
"Chama atenção a aparente incompatibilidade entre o porte / estrutura, vis à vis o volume transacionado a crédito no período analisado, o que supostamente pode demonstrar que cliente esteja utilizando a conta para transacionar recursos provenientes de atividades não declaradas" diz o relatório do Coaf.
O documento detalha que, no período de janeiro de 2020 a abril de 2023, a conta da Cedro recebeu R$ 16.663.279,33, e fez transferências de R$ 16.609.427,22. Isso não significa que seja o extrato da conta da empresa no período, já que o RIF traz, segundo informações de técnicos da CPI, apenas as movimentações comunicadas pelo sistema bancário como atípicas.
O RIF aponta ainda que foram identificados dois repasses feitos pela Cedro, no valor de R$ 8,3 mil ao sargento dos Reis. Em documento anexo, no entanto, há indicação de R$ 18,8 mil ao militar.
Entre os anexos enviados à CPI, o Coaf informa que o sargento recebe rendimentos mensais de R$ 10,7 mil como servidor público federal e outros R$ 542,08 como investidor, chamando atenção para a movimentação financeira de R$ 2,9 milhões.
Procurada pelo POPULAR, a Cedro manifestou que Vanderlei ja deu explicações a veículos de imprensa de que fez empréstimo ao sargento dos Reis, que é conhecido da família e com quem ele também já participou de consórcios de dinheiro.
Disse ainda que a empresa aguarda ser notificada pela PF ou pela CPI para ter informações sobre as investigações, e nega conhecimento sobre qualquer pagamento a Michelle Bolsonaro.
Sobre os contratos com o governo federal, a madeireira informou que participou de pregões eletrônicos e que fez a entrega dos materiais, cumprindo as obrigações acertadas nos documentos.
Sobre a movimentação de R$ 33 milhões e os recebimentos de valores de outras empresas que também tiveram contrato com o governo federal, a Cedro afirmou que teria de ser ouvido o proprietário, que está em viagem. A empresa completou ainda que é preciso considerar que as informações do RIF são de longo período (2020-2023).
Outras empresas
Os dados do RIF da Cedro apontam pelo menos duas empresas que fizeram transferência à empresa e tiveram contrato com o governo federal na gestão passada: Ankara Engenharia, de Salvador, que repassou R$ 56 mil, e Somar Representação e Comércio, de Goiânia, que fez três transações de R$ 199 mil.
A primeira recebeu R$ 42 milhões do governo federal, sendo R$ 18,7 milhões da Codevasf.
Já a segunda recebeu R$ 2,29 milhões na gestão Bolsonaro, sendo R$ 1,4 milhão da Codevasf. Entre os 12 contratos com a estatal, a empresa prestou serviço para a superintendência em Goiás: 2 contratos ao total de R$ 933,1 mil para fornecimento de 21 plantadeiras e adubadeiras.
Os recursos vieram de emendas da bancada e do Mrelator.
A empresa pertence, segundo registro na Receita, a Maria Wanuzia Batista Barros e Cláudio de
Barros Nunes. Procurada, a Somar informou que apenas Wanuzia poderia falar, e que ela foi submetida a cirurgia e estará de licença médica pelos próximos 30 dias. Um dos funcionários disse ainda que a empresa não é investigada por nenhum órgão e que é preciso aguardar se a CPI identificará qualquer irregularidade.