02/05/2011
Paulo Araújo: jornalista potiguar...quase perto de Bin Laden
[0] Comentários | Deixe seu comentário.A morte do terrorista Osama Bin Laden, aguardada há quase 10 anos - desde o fatídico 11 de setembro de 2001 - marca a alegria do mundo nesta segunda-feira preguiçosa de tempo instável em Natal.
O twitter congestionou de informações e piadas sobre o terrorista que anda fazendo mal até depois de morto: o site da Veja anuncia que a morte de Bin provocou a alta do dólar. Pode?
Rosa, a funcionária da casa, chegou assustada me perguntando: "Dona Thaisa, ele morreu mesmo? Chegou uma mensagem no meu celular e eu achava que era mentira".
Pois, pois...Bin Laden, assim como em 11 de setembro de 2001 (dia muuuito especial pra mim, mas essa é uma história muito particular, e não tem nada a ver com a queda das torres gêmeas) é a notícia do dia.
Da minha cozinha, à Casa Branca...
E do jornalista amigo Paulinho Araújo, que hoje habita por São Paulo, recebo um texto onde ele lembra que um dia se sentiu bem próximo de Bin Laden.
Ainda bem que ele só se sentiu...
Não sei se estaria assinando as linhas que publico a seguir, caso tivesse conseguido chegar mais perto do que chegou do terrorista do século. Que certamente já tem um substituto. Infelizmente.
Eis o texto de Paulinho:
DE COMO EU JÁ ESTIVE A DOIS GRAUS DE PROXIMIDADE DE OSAMA BIN LADEN Paulo Araújo - Jornalista
Robert Fisk é um jornalista britânico que há mais de 30 anos cobre os conflitos do Oriente Médio a partir de Beirute, no Líbano, para o jornal ingles The Independent. Autor dos livros "Pobre Nação" e "A Grande Guerra Pela Civilização" do (Ed. Record), Fisk tem um feito inédito no currículo, cristalizado eternamente neste 1 de maio: foi o único jornalista em atividade a entrevistar ninguém menos do que Osama Bin Laden, o terrorista mais famoso de todos os tempos, morto ontem pelas forças militares dos Estados Unidos.
De pele rosada, dentes tortos, sotaque britânico fortíssimo e uma capacidade de falar sem parar impressionante, ele também se destaca entre os colegas por uma característica impensável em dias de google: Fisk jamais usa computador para fazer pesquisas. Anda para cima e para baixo com uma pasta cheia de recortes de jornais - muitos dos quais assinados por ele próprio – e é capaz de lembrar de fatos, datas e lugares do intricado mundo árabe com a precisão do Big Ben.
Encontrei com Robert Fisk em julho de 2007 durante a Flip, Festa Literária de Paraty, no Rio de Janeiro, na condição de repórter da revista Nova Escola, da Editora Abril. Juntamente com o jornalista Lawrence Wright, editor da célèbre revista The New Yorker e autor do livro O Vulto das Torres (Ed. Cia. Das Letras), um estudo psicológico minucioso sobre a mente de Bin Laden, Fisk discutiu numa mesa redonda concorridíssima como o jornalismo internacional se comporta frente à era de atentados terrorisas perpretados contra o chamado “Ocidente Civilizado”, cujo ápice foi o 11 de Setembro. O cara faz isso desde os anos 60. Tem envergadura, estofo, régua e compasso para ir além da dicotomia bandido-mocinho que estamos vendo hoje na cobertura da morte de Bin Laden.
Anos antes do fatídico dia que reduziu a pó as duas torres do World Trade Center, em Nova York, Robert Fisk encontrou-se com Bin Laden duas vezes para entrevistá-lo para o Independent. Sempre vendado e guiado por milícias do Talibã, o jornalista foi conduzido a montanhas entre o Afeganistão e Paquistão e, nas suas palavras, encontrou um homem sensível, instruído, com um profundo sentimento de revolta contra os Estados Unidos – país que, é bom lembrar, fomentou o surgimento de grupos como a Al Qaeda na luta conta os avanços da União Soviética comunista.
Fisk é polêmico nas suas opiniões, mas extremamente respeitado como um dos maiores especialistas em mundo árabe fora das academias. Seus dois livros, que juntos somam mais de 1.500 páginas, são verdadeiros tratados sobre as origens imcompreensíveis do ódio em regiões como a Faixa de Gaza e Cisjordânia, em Israel, o Líbano, o Egito, o Paquistão, o Afesganistão, e o surgimento de grupos como o Hamas, Fatah, Rezbollah e, claro, Al Qaeda de Bin Laden.
Na nossa conversa em privado, ocorrida no pátio da pousada colonial em que se hospedava em Paraty, Fisk confessou que já havia ouvido falar num movimento popular no Brasil chamado Cangaço e que gostaria de ter mais informações sobre. Me comprometi a enviar-lhe por e-mail algumas referências, o que fiz logo em seguida. Na conversa com outros jornalistas, pareceu transmutar-se ao falar de mais detalhes sobre os dois encontros com Bin Laden, sempre reforçando que ocorreram antes do terrista morto ontem transformar-se no mito pós atentados de Nova York. Muito mais do que se vangloriar do fato, tomou para si o papel de ser o outro lado da história, fato cada vez mais raro no jornalismo mundial.
Na mesa redonda com Lawrence Wright, um dos maiores pesquisadores sobre a cabeça de Bin Laden, o clima esquentou e os dois foram quase às vias de fato, cada um defendendo o mesmo personagem sob ângulos opostos. Lawrence, de voz pausada e praticamente saído de uma toallete num hotel da Quinta Avenida, era a própria representação da voz americana, machucada pelo horror do 11 de Setembro e procurando uma justificativa para os ataques que o país sofreu. Já Fisk era uma espécie de “Pantera no Porão”, soltando fogo pelas narinas, vermelho, com o sotaque britânico cada vez mais carregado quando afirmava: “as coisas não são bem assim como parecem”.
Hoje, acompanhando o noticiário, lembrei que a minha conversa com Robert Fisk está gravada numa fita K-7, instrumento que não é mais usado em tempos de iPads e gravadores digitais. Se o tempo e o bolor não tiverem danificado o acetato da fita, vou escutá-la com muita atenção, trancrevê-la e traduzi-la para que, quatro anos depois, seja possível relembrar o que essa voz tão importante do jornalismo mundial disse sobre os dois encontros que teve com Osama Bin Laden.
Robert Fisk