03/07/2010
Coragem e sabedoria em 140 caracteres, na visão do advogado Ivan Maciel
[0] Comentários | Deixe seu comentário.Na página de Opinião da Tribuna do Norte deste sábado, chamou atenção o artigo do advogado Ivan Maciel.
Tuiteiro, identificado pelo perfil de @Ivan_maciel, ele falou exatamente sobre o twitter. Ferramenta da internet que instiga, estimula, encoraja, celebriza...
Eis o artigo que o Blog reproduz, na íntegra:
A INTERAÇÃO EM MINIATURA
Ivan Maciel de Andrade
Advogado
Há escritores que sofrem para construir suas frases, refazendo-as diversas vezes, numa busca extenuante da perfeição, como é o caso do francês Gustave Flaubert (1821-1880), autor de “Madame Bovary” e de outras obras-primas. Há outros escritores que são o oposto: produzem em pouquíssimo tempo grande quantidade de livros e, note-se, nem sempre de qualidade inferior.
O belga Georges Simenon (1903-1989), por exemplo, escrevia um bom romance policial, tendo como principal personagem o Comissário Maigret, em algumas semanas e, às vezes, em escassos dias, num impulso criativo que mal permitia que ele se levantasse do local onde estava escrevendo. Foi assim que publicou cerca de 190 romances e 128 novelas, além de uma quantidade enorme de contos e até mesmo uma autobiografia. Simenon é um dos escritores mais traduzidos de toda a literatura universal – escreveu em francês – e também um dos mais lidos, o que é comprovado pelo número gigantesco de reedições obtidos por seus principais romances.
Por sinal, tenho grande parte de seus livros em minha biblioteca: quase toda a série de Maigret e alguns outros romances policiais, sem o Comissário, mas excelentes. Ainda hoje vale a pena tentar descobrir livros de Simenon que não tivemos a oportunidade de ler. Boas editoras lançam frequentemente obras suas que ainda estão inéditas em português. O problema é que Simenon era tão prolífico que os próprios editores perdem o controle da real extensão do que ele produziu. E isso causa grandes e agradáveis surpresas nos sempre fiéis leitores de Simenon.
Mas sem a obsessiva e genial preocupação estilística de Gustave Flaubert e o prodigioso poder de criação de Georges Simenon – existe hoje uma inimaginável quantidade de pessoas que se dedicam a escrever sobre os mais diferentes assuntos: as últimas notícias, os mais recentes acontecimentos políticos, os seus próprios pensamentos e reflexões e, não raramente, fatos do cotidiano de cada um. A grande maioria estabelece diálogos que se renovam e se prolongam de forma interminável. E todos escrevem num estado de compulsão que não os deixa parar: à espreita do que eles vão dizer, nos 140 caracteres que lhes são oferecidos, estão os seus “seguidores” – legião de leitores previamente identificados.
Como seria de esperar, as “celebridades” dispõem de uma quantidade astronômica de seguidores, que as acompanham e reproduzem, como caixa de ressonância, o que dizem de mais (in)significativo os seus ídolos. Alguns “blogueiros” também conseguem atrair e manter o interesse de grande número de seguidores, ávidos por notícias e comentários, digamos, “saídos do forno”. Quanto mais atualizado e hábil analista for o “blogueiro”, certamente maior chance tem de ampliar e enriquecer o seu patrimônio de seguidores, o que lhe confere não só status como credibilidade. Talvez até mais do que sua atuação na imprensa.
Todo mundo sabe, a esta altura, que estou me referindo ao Twitter. O que há de diferente e sedutor nessa específica rede social da internet? É a facilidade e liberdade com que se pode utilizá-la. Basta uma descomplicada habilitação para ficar diante do espaço em que se pode escrever o que quiser, com a única condição de que o faça em determinado número de caracteres. A partir daí, todos se tornam redatores miniaturistas, autores de pequenos textos. Mas com a convicção da validade desse exercício de comunicação, com o prazer e a sensação do desafio de quem sente a necessidade de expressar-se e de expor a sua própria forma de ser. Uma modalidade de interação sem controle explícito (remanesce o autocontrole) e sem padrões de comportamento.
Observo na atuação dos jornalistas “tuiteiros” que eles se tornam mais ousados e incisivos em suas opiniões, sobretudo quanto se trata de matéria política. Isso permite que notícias impactantes ultrapassem os limites das espúrias conveniências. Daí a ojeriza dos regimes autoritários. Na verdade, o Twitter talvez seja hoje o mais democratizante e poderoso difusor universal de informações e ideias.