20/01/2010
O relato de um correspondente da Veja, via twitter, na capital do Haiti
[0] Comentários | Deixe seu comentário.O jornalista brasiliense Diego Escosteguy, da revista Veja, está em Porto Príncipe, no Haiti, cobrindo o momento trágico que vive o país depois do terremoto que matou um sem número de pessoas, e deixou quase toda a cidade desabrigada.
Além de notícias em tempo real no blog www.veja.abril.com.br/blog/terremoto-haiti, ele conversa todas as noites com seus seguidores do twitter.
Eis algumas impressões do jornalista que deverá ficar no Haiti até o final da semana.
E que presencia, além da desgraça humana, a desgraça desumana na disputa de egos...
Acredita que até no Haiti aparece quem queira ser melhor que o outro?
“Nas ruas, percebo muita ciumeira entre as equipes de resgate. Pura vaidade”, relatou Escosteguy.
Abaixo, os posts do jornalista desta terça, e alguns da segunda-feira.
*
Terça-feira
-Vi pouca ajuda e muitos corpos nas ruas de Porto Príncipe.
-Os resgates e a distribuição de comida continuam desorganizados.
-Cada momento aqui me impressiona. A maioria de um modo violento, triste. Mas também há instantes de extrema humanidade.
-Vi espasmos de sobrevivência. Gente com galões de água, alguns comendo. Isso na região menos pobre da cidade.
-A cidade está às escuras. Nas ruas, só enxerguei faróis. Aqui há um gerador.
-Eu iria a Cité Soleil, mas o taxista recusou-se. É o lugar mais perigoso da cidade.
-Acabei indo ao centro, onde só sobraram concreto e corpos - e o silêncio.
-Também fui a Pétionville, a região menos pobre. Foi lá que vi gente comendo e bebendo água. Alguns, quer dizer.
-Estou por fora da questão sanitária. Mas não tenho dúvidas de que haverá problemas severos. Pessoas tomam banho de esgoto.
-Nas ruas, percebo muita ciumeira entre as equipes de resgate. Pura vaidade. No plano político, não sei. Só ouço fofocas.
-O único procedimento é queimar os corpos. O problema é que há muitos soterrados. Estes continuam lá.
-Ter dinheiro sempre faz diferença. Aqui, alguns dólares podem fazer a diferença entre viver ou morrer.
-O único sinal de normalidade, são os semáforos. Continuam funcionando. O resto não existe.
-Nunca esquecerei as fogueiras de corpos.
-Andamos sozinhos. Se fôssemos rodar com os militares, nossa visão da tragédia seria míope.
-As noites são silenciosas. Silenciosas e angustiantes, ao menos para mim.
-Não encontrei bandidos nem gangues. Só famélicos brigando por qualquer pedaço de lixo.
-O cheiro está cada vez pior. Uso máscara, mas não ajuda muito.
-Todos dormem ao relento. Agrupam-se em calçadas ou praças.
-Devo ficar até sexta ou sábado. Não sei se aguento mais do que isso.
-Os bombeiros de Brasília e do Rio estão ajudando. Mas, até onde sei, no hotel da ONU.
-A força dos haitianos é admirável. Eles estão sobrevivendo dentro de uma lixeira.
-Chuviscou hoje. Houve apreensão. Se chover forte, o risco de epidemias aumenta bastante.
Segunda-feira
-Ninguém deve vir para cá apenas por ímpeto. É perigoso. Melhor ajudar doando - e pressionando o governo a mandar mais ajuda.
-Os corpos estão sendo queimados. A maioria em valas comuns, alguns nas ruas mesmo.
-Parece-me cedo para fazer previsões sobre o futuro do Haiti. O passado do país não nos permite ter grandes esperanças.
-Fazem tudo na rua. Dormem, urinam, defecam, tomam banho de água suja. O que você imaginar, multiplique por dez.
-Na minha visão, não há grandes furos a serem obtidos aqui. A tragédia é pública. O que faz a diferença é a força da reportagem.
-Estimativas de mortos variam demais. Acho que nunca se saberá. A carne humana está se misturando aos pedaços de concreto.