12/07/2008
A discriminação social denunciada pelo secretário Rubens Lemos
[0] Comentários | Deixe seu comentário.No seu site onde publica textos primorosos, o jornalista Rubens Lemos joga na cara da sociedade um exemplo de discriminação social.
Que o Blog reproduz na íntegra.
ESCÂNDALO DOS SULTÕES
No tempo dos sultões, o poder tudo podia. Sultão é um título islâmico com diversos significados históricos. Originalmente, era um substantivo abstrato árabe que significava "força", "autoridade", "domínio”, “pujança”, “arrogância”, “superioridade material sobrepondo-se à igualdade racial”.
Os sultões, que tiveram em Istambul seu santuário ocupavam criptas quando morriam. Eram embalsamados. Ficavam mais feios que os defuntos comuns, que se decompõem, ficam esqueléticos e retornam ao pó. A morte moderna prevê o enterro em caixões, uns mais caros, outros mais baratos, em que cabe apenas uma pessoa vestida, com uma simples mortalha ou um smoking se a família preferir.
Descem todos para um lugar chamado túmulo, cova no interior, onde permanecem apodrecendo até desaparecerem por completo. Não é permitido o acesso de extratos bancários. Carros e mansões não cabem em função do espaço de sete palmos de terra. Crema-se também, quando o infeliz transforma-se num galeto até virar cinza igual às que saem dos cigarros. O tamanho é sem tirar nem por idêntico para o ricaço e o favelado.
Alguns sultões de Natal não perceberam isso. Meu queixo acaba de cair com a história contada pela mulher de um amigo meu – que deixarei preservadas as identidades até que a Justiça torne o caso público. É um casal trabalhador e destacado na cidade. O pai dela um grande amigo dos meus pais. O casal resolveu mandar o filho, que estuda num colégio tradicional, a um passeio na Disney. O menino foi convidado por outros dois para ficar junto com eles num quarto durante o passeio.
Tudo certo como dois e dois são cinco. A mãe foi chamada pela agência de viagens que comunicou: o seu filho não poderia ficar junto com os dois no quarto porque não era “compatível socialmente”. Ou seja, não poderia ficar com os sultõezinhos, filhos de gente que bem poderia ter a riqueza vasculhada pelas autoridades fiscais. A culpa não fora da agência que tentara conciliar, mas os dois casais de sultões, pais dos sultõezinhos inocentes, fincaram pé. Não queriam os dele com o do casal amigo meu.
Nenhum jornal vai publicar a história porque envolve gente poderosa, esnobe e preconceituosa. Rica e discriminatória. Que sequer imaginou o que passa pela cabeça do garoto que teve de sair de perto dos potentados para se juntar “aos seus”. Que educação terão os filhos dos sultões do jet? Serão ou já são meninos mimados, chatos, frescos, assim como os pais?
A mãe me garantiu que vai à Justiça. Tem que ir. É crime tipificado no Código Penal. Discriminação beirando a racismo. Dá de dois a quatro anos de cadeia. E lá todo mundo também é igual. Não tem banheira de ouro, carro importado, dólar estourando pelo ladrão. Ladrão até tem mas de padrão social diferente.
Fiquei revoltado, pelo sofrimento dos pais e por ter um filho da mesma idade que o deles.
Certas coisas não acontecem comigo. Ainda bem.
Fosse com meu filho, seriam dois sultões baixando a sepultura. Cada um com tiro no meio da testa. No cemitério também não há divisão de classe social.
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